Rodolfo Vidal
Há uma habilidade silenciosa que define a maturidade de um gestor: a capacidade de perceber quando um ciclo está mudando e agir antes que isso se torne urgente.
Nos últimos anos, especialmente com o avanço do digital, essa habilidade deixou de ser um diferencial e se tornou uma necessidade básica de sobrevivência para as empresas.
Por natureza, gestores tendem a se apegar ao que funcionou. Quando um produto vende, quando um processo se estabiliza, quando os indicadores apontam para cima, o impulso natural é proteger aquilo que deu certo e até mesmo alavancar.
Mas, o problema é simples: o que funcionou ontem não garante resultado amanhã.
A questão central nunca é se o mercado vai mudar, mas quando. E, principalmente, se você estará atento o suficiente para enxergar os primeiros sinais.
Durante a pandemia, o consumo digital viveu um pico repentino.
No setor de educação online (onde atuo), a combinação entre isolamento, tempo livre e digitalização acelerada criou uma demanda inédita. Milhares de pessoas, antes resistentes ao aprendizado online, passaram a consumir cursos com naturalidade.
Mas há um ponto essencial: aquele crescimento não foi natural, ele foi antecipado.
A pandemia trouxe para 2020 e 2021 uma demanda que talvez só acontecesse em 2025 ou 2026. E, como todo ciclo acelerado demais, o que veio em seguida foi a queda.
Hoje, em 2025, isso está claro:
Não é desinteresse. É mudança de comportamento. O produto deixou de acompanhar a forma de consumo do cliente.
Provavelmente, entre 2019 e 2022, você viu muita gente dizendo que “ficou milionária na internet”. E isso de fato aconteceu. Mas, olhando agora com mais clareza, percebemos que aquele crescimento não era sustentável.
Enquanto tudo isso acontecia, um movimento paralelo chamou minha atenção: os grandes nomes do marketing digital começaram a agir de forma cada vez mais agressiva.
Ofertas mirabolantes. Promessas exageradas. Parcerias improváveis.
Campanhas desenhadas para disputar atenção a qualquer custo.
Para muitos, isso era apenas mais um capítulo do mercado. Para mim, era um alerta estratégico.
Quando players laterais ou concorrentes, precisam radicalizar para manter resultados, o recado é claro: o modelo está perdendo eficiência.
O que funcionava em 2020 já não funcionava mais em 2023. E hoje, em 2025, isso é ainda mais evidente.
O mercado estava dizendo, de forma não verbal, que algo precisaria mudar.
Dentro da Fisarmonica, os números continuavam positivos. Continuávamos a crescer os nossos números de alunos, chegando a mais de 20 mil clientes e mais de R$ 10 milhões em vendas.
Por fora, tudo parecia firme. Mas, no contato direto com os alunos, surgia outra história.
Eles diziam:
Pequenas frases que, quando colocadas lado a lado, revelavam algo maior: o cliente já não queria apenas conteúdo, queria companhia no processo.
Foi com base nesses sinais que começamos a testar novos formatos:
E cada teste reforçava a mesma conclusão: a próxima fase da educação não seria construída em cima de conteúdos gravados ou ebooks.
Foi nesse cenário que fiz a pergunta mais importante da minha jornada como gestor (até agora):
“Se eu fosse começar esse negócio hoje, eu faria exatamente igual?”
A resposta foi: não.
Se estivéssemos começando do zero, não criaríamos uma plataforma de cursos. Criaríamos uma experiência interativa e personalizada. Esse foi o ponto de partida da Kords.
A decisão não nasceu de uma crise, mas de uma leitura de futuro. Não mudamos porque o modelo quebrou, mudamos porque ele quebraria, e porque havia um caminho muito maior adiante.
Antecipar ciclos é exatamente isso: mudar enquanto ainda está tudo bem.
Hoje entendo que a mudança foi, acima de tudo, um compromisso com a realidade. O mercado estava mudando, o cliente estava mudando e ignorar isso seria fechar os olhos para o óbvio.
Gestão é ouvir o que o mercado sussurra, não apenas o que ele grita. E agir antes do barulho começar.
Como disse Jack Welch: “Mude antes que você precise.”
No fim, esse é o papel de qualquer gestor que deseja construir uma empresa durável.