Quando um CEO deixa uma empresa, muitas vezes tudo muda — menos o que deveria mudar. Trocam-se nomes, mas não narrativas. Mudam os cargos, mas não os costumes. A transição de um líder costuma ser tratada como um evento operacional, não estratégico. A sucessão, como um problema a ser resolvido — e não uma oportunidade de repensar legado, cultura e direção.
A liderança do papa Francisco, viva ou em memória, nos oferece uma lente rara e valiosa para refletirmos sobre o que é, de fato, liderar com propósito. Ele não só ocupou a cadeira mais simbólica da Igreja — ele a redesenhou com gestos, hábitos e rupturas discretas. E ao fazer isso, deixou marcas que vão além de sua figura.
A seguir, cinco lições que executivos, fundadores e conselheiros podem (e deveriam) aprender com Francisco:
Francisco não precisou de campanhas para comunicar o que acreditava. Sua escolha por uma vida austera, seu foco em justiça social, sua linguagem acessível — tudo isso era o próprio plano estratégico da sua liderança. Ele não apenas falava de valores, ele encarnava valores. Líderes que falam de propósito mas agem por conveniência criam culturas cínicas. Valores não vividos geram equipes desmotivadas.
Ao priorizar a construção de uma cultura de simplicidade, acolhimento e transparência, Francisco mexeu nas bases institucionais da Igreja. Mudou rotinas, práticas e até o tom da comunicação. Cultura, como bem sabemos, é o hábito coletivo que sobrevive à ausência da liderança. Você, gestor, está construindo um modelo onde seus valores permanecem sem você?
A Igreja entende de transições. Séculos de história forjaram protocolos, ritos e estruturas para preservar o que é essencial e renovar o que é contingente. No mundo corporativo, isso raramente acontece. Muitos líderes confundem sua presença com a estratégia da empresa — e, quando saem, deixam um vácuo. Empresas maduras formam sucessores, não sósias. E estruturam o negócio para viver além de seus fundadores.
Ao recusar o luxo do Palácio Apostólico e viver em uma residência simples, Francisco emitiu um sinal claro ao mundo e à sua organização: a autoridade moral importa mais que o poder institucional. Pequenos gestos criam grandes mensagens. A forma como você chega a uma reunião, a atenção que dedica ao time, as perguntas que faz — tudo isso comunica. E sua equipe está sempre ouvindo, mesmo que você não esteja falando.
A Igreja é uma das instituições mais antigas e resistentes à mudança no mundo. Ainda assim, Francisco promoveu reformas internas, abriu debates antes impensáveis e reaproximou a instituição de públicos esquecidos. Ele não fez isso rompendo com o passado, mas ressignificando-o. Se até o Vaticano pode se adaptar, sua empresa também pode — desde que exista clareza, escuta e firmeza de propósito.
O Papa Francisco, grande e respeitado líder em todo o mundo, faleceu nesta segunda-feira (21). Foto: Reprodução/CNBB
O papa Francisco, com todos os seus acertos e polêmicas, nos lembra que liderança é um ofício espiritual — mesmo no mundo dos negócios. É sobre criar uma cultura onde o time se desenvolve, onde o propósito é claro, onde os processos resistem às pessoas e onde as pessoas se sentem parte de algo maior.
Não sabemos quando será a transição no Vaticano e nem quem virá. Mas sabemos que, quando ela vier, haverá legado, rumo, mudanças e continuidade. A pergunta que deixo é: se você saísse da sua empresa hoje, o que ficaria?