“A Cópia” é o nome da mostra que apresenta uma série de xilogravuras inauguradas por Rafael Pagatini na Galeria Homero Massena, em Vitória. A mostra desafia as memórias institucionais em um contexto em que a digitalização e as redes sociais transformam a interação do público com a arte. O evento de abertura está marcado para a próxima terça-feira (05), das 17h às 20h, e a exposição permanecerá em cartaz até 10 de fevereiro de 2024.
Conhecido por sua abordagem crítica em relação às memórias da ditadura militar brasileira, Rafael Pagatini utiliza a obra “Fim de Romance” (1912), de Antônio Parreiras, como ponto focal. A partir de uma pesquisa minuciosa nos arquivos da Pinacoteca do Estado de São Paulo, o artista revela camadas ocultas de informações, explorando as interações entre a obra, o museu e a história política do Brasil.
O projeto nasceu do interesse em explorar o envolvimento da classe artística com a ditadura militar brasileira. Pagatini destaca que, no âmbito das artes visuais, a produção durante esse período era frequentemente vista como forma de questionamento e resistência ao regime. “Contudo, é notável que algumas instituições culturais tenham se aproximado do governo, visando estruturar políticas públicas para os espaços culturais”, ressalta. Como exemplo, cita a Pinacoteca do Estado de São Paulo, uma das instituições que ganharam destaque nacional impulsionadas por financiamentos e políticas de incentivo à cultura da época.
Ao longo de sua pesquisa nos arquivos da instituição, Pagatini descobriu documentos não digitalizados que revelaram interações entre o museu e o estado ditatorial. Um achado significativo foi a descoberta de documentos que mostram que, durante a reabertura do museu em 1973, o general Emílio Garrastazu Médici visitou o local acompanhado pelo diretor Walter Ney e pelo governador de São Paulo da época. “Durante minha pesquisa, dediquei um longo período ao estudo dos arquivos da instituição, buscando evidências de possíveis interações entre o museu e o Estado ditatorial. Um achado significativo foi a descoberta de documentos não digitalizados, os quais revelaram que, durante a reabertura do museu, após reformas em 1973, o general Emílio Garrastazu Médici, acompanhado pelo então diretor Walter Ney e pelo governador de São Paulo da época, visitou o local. Inclusive, apresento na exposição um documento e uma fotografia desse encontro.”
Segundo Pagatini, durante essa visita, Médici mostrou-se particularmente impressionado pela obra “Fim de Romance”, de Antônio Parreiras, que estava em exibição. Após a visita, Walter Ney encomendou a um pintor uma réplica da obra, que foi posteriormente presenteada ao general. Pagatini destaca a descoberta desses documentos pois revelam a disposição do diretor do museu em demonstrar um gesto empático com Médici.
“Além disso, a escolha da pintura, que retrata um homem morto com um revólver em mãos ao lado de um cavalo, chamou minha atenção pela sua natureza sombria. Principalmente por ser o auge da repressão política, na qual presos políticos eram torturados no espaço que hoje pertence à Pinacoteca. Com essas informações, consegui adicionar à ficha catalográfica da obra a existência dessa cópia e a relevância dos arquivos encontrados”, acrescenta Pagatini.
Rafael Pagatini é professor na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e doutor em Artes pela Unicamp, tem uma trajetória artística que inclui exposições nacionais e internacionais, com foco na estética da memória e no estatuto da imagem na contemporaneidade. Sua pesquisa sobre as memórias da ditadura militar brasileira tem raízes nas investigações realizadas em Vitória, buscando entender como esse período histórico foi vivenciado no Espírito Santo.
Em “A Cópia”, Rafael reflete sobre o acesso às informações institucionais por meio da arte. As obras são xilogravuras criadas com base em fotografias da pintura “Fim de Romance”. Algumas imagens são claramente identificáveis, enquanto outras se transformam em abstrações intrigantes. “Um aspecto fascinante dessas abstrações é que elas são derivadas de imagens capturadas bem próximas da pintura, revelando detalhes imperceptíveis a olho nu, como as pinceladas e o craquelê da tinta”, diz Pagatini.
Ele explica que a técnica de reproduzir a pintura por meio de pequenos quadrados, que juntos formam a percepção visual das imagens, alude aos pixels das imagens digitais, presentes na vida contemporânea.
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