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Você conhece a Insurreição do Queimado? Podcast dá voz à revolta que marcou a história capixaba

Publicado em: 13/05/2025

Neste 13 de maio, data em que é celebrada a abolição da escravatura no Brasil, o Orgulho Capixaba te convida a conhecer (ou relembrar) um episódio marcante na história da luta antiescravista no Espírito Santo: a Insurreição do Queimado

 

Poucas pessoas no Espírito Santo conhecem a Insurreição do Queimado, uma das mais importantes revoltas antiescravistas do Brasil, ocorrida em 1849, na Freguesia do Queimado — hoje, município da Serra. Foi justamente para trazer à tona esse episódio da história capixaba que a jornalista recém-formada, Isabela Xavier Marques, 23 anos, decidiu criar o podcast “Estado de Espírito”, apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na graduação em Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

O primeiro episódio do podcast, dedicado à Insurreição do Queimado e produto do TCC de Isabela, sob orientação do professor Dr. José Antonio Martinuzzo, foi apresentado à banca no dia 27 de março e aprovado com nota 10. A proposta do projeto é debater a identidade cultural capixaba a partir de histórias silenciadas ou pouco conhecidas, mas que ainda reverberam no presente.

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Isabela Xavier (de vestido preto) com a banca, após apresentação do TCC. Foto: Arquivo pessoal

“Assim que eu conheci a história da Insurreição fiquei pensando sobre a magnitude e urgência dela na sociedade capixaba e brasileira, e sobre como ela não é tão popular aqui no Estado, ainda mais sobre a novidade de ser o primeiro livro-reportagem do Brasil, o que é completamente desconhecido”, explica Isabela.

A história foi documentada originalmente pelo advogado e jornalista Afonso Cláudio, em 1884, e reapresentada em 2023 por Martinuzzo no livro “Insurreição do Queimado – 140 anos do pioneirismo de Afonso Cláudio no livro-reportagem nacional”, onde o autor defende o texto como o primeiro livro-reportagem do Brasil.

Os livros de Afonso Cláudio (1884) e de José Antonio Martinuzzo (2023). Foto: Arquivo pessoal

Isabela se inspirou em um formato de podcast jornalístico narrativo que já acompanhava e viu ali a oportunidade de adaptar o modelo para contar histórias do Espírito Santo com o mesmo cuidado investigativo e narrativo.

“Um podcast que levasse em consideração histórias interessantes, importantes para a cultura espírito-santense e pouco disseminadas na sociedade, produzida com rigor jornalístico de apuração e pesquisa, e com um roteiro narrativo atraente”, conta Isabela sobre a ideia do projeto.

 

O que foi a Insurreição do Queimado?

A história contada no episódio se refere à revolta liderada por cerca de 200 pessoas escravizadas, após uma promessa de liberdade feita pelo frade italiano Gregório de Bene. O religioso havia sido incumbido de construir uma igreja em honra a São José e, para acelerar a obra, prometeu alforriar os trabalhadores no dia do santo, 19 de março. Ao perceberem a aproximação da data sem sinais do cumprimento da promessa, os escravizados se organizaram e marcharam em direção à igreja.

Comandados por nomes como Elisiário, Chico Prego e João da Viúva Monteiro, os revoltosos reivindicaram sua liberdade durante a missa de inauguração. O frade, porém, abandonou o templo com os fiéis e deixou os insurgentes à própria sorte. A revolta foi duramente reprimida já no dia seguinte, com mortes, perseguições, condenações à forca e açoitamentos.

No memorial do TCC, Isabela Xavier descreve que “dos cinco condenados à forca, três fugiram da cadeia. Chico Prego foi enforcado na Vila da Serra (Serra Sede) em 8 de janeiro de 1850 e João da Viúva Monteiro em frente a Igreja de São José do Queimado em 11 de janeiro do mesmo ano”, evidenciando a brutalidade da repressão.

Sobre suas descobertas durante a pesquisa, Isabela conta que o projeto possibilitou “saber mais detalhes sobre o caso, saber de coisas detalhadas nos documentos oficiais da época, entender o contexto dessa história naquele período e de como ele não está tão distante de nós”.

Estátua de Chico Prego, na Praça Almirante Tamandaré, na Serra. Foto: Everton Nunes/Prefeitura da Serra

Produção no campo e escuta fora da universidade

Para dar vida ao episódio, Isabela buscou gravar entrevistas nos próprios locais onde a história aconteceu, o que trouxe desafios para a produção. “Eu queria gravar entrevistas externas, nas ruas e nos locais onde ocorreram a Insurreição. Então acredito que o maior desafio foi depender de condições climáticas, locomoção e qualidade do áudio para gravar nesses ambientes”, compartilha Xavier.

Mas o esforço foi recompensado. Além da recepção positiva da banca, que avaliou o trabalho com nota máxima, o podcast começou a repercutir também fora do ambiente universitário.

“Como projeto de TCC o resultado foi ótimo, o trabalho foi bem elogiado e aprovado com nota máxima no curso. Para fora da Universidade o resultado também está sendo bom, várias pessoas, além dos meus amigos, estão escutando o episódio e dando feedbacks positivos”, comemora.

E o projeto não para por aí. Isabela já tem estrutura pensada para mais quatro episódios do “Estado de Espírito” e aguarda editais de incentivo à cultura para continuar a produção. “Vou seguir com o mesmo objetivo de pautar histórias ricas e atraentes sobre o nosso Estado que explore locais e personagens importantes”, garante.

Neste 13 de maio, dia em que se faz memória da abolição da escravidão no Brasil, relembrar histórias como a da Insurreição do Queimado é fundamental para refletir sobre as lutas por liberdade e justiça, e sobre como elas seguem sendo necessárias até hoje.

Isabela Xavier tem planos de continuar a contar histórias capixabas. Foto: Arquivo pessoal

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